A Responsabilidade dos Sócios na Área Trabalhista

Integrar sociedade empresarial é atividade de grande responsabilidade, diante das complexidades econômicas, políticas e sociais da atualidade. Por essa razão é que o ordenamento jurídico brasileiro estabelece normas de fiscalização e organização do trabalho, bem como, estipula os limites para responsabilização dos sócios, o que pode ser verificado em legislações especiais, na Consolidação das Leis Trabalhistas e no Código Civil.

Nesse sentido, na hipótese de uma sociedade vir a responder pelas dívidas trabalhistas da empresa[1], poderia o sócio também ser responsabilizado, inclusive com seus bens particulares?

A resposta para esta pergunta é positiva, porém, alguns limites e critérios legais precisam ser observados.

É comum acreditar que integrar uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada isentaria o sócio da responsabilização pessoal, contudo, o que se tem visto na jurisprudência trabalhista é uma ampliação das hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica e responsabilização pessoal do sócio.

AGRAVO DE PETIÇÃO. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. SÓCIOS RETIRANTES. Distribuída a ação anteriormente ao término da vigência da responsabilidade dos sócios retirantes, apurada nos termos dos artigos 1.003 e 1.032, do Código Civil, viável será sua responsabilização pela integralização do quantum debeatur, desde que se tenham beneficiado do labor prestado pelo trabalhador. Considerando que a desconsideração da personalidade jurídica abarcou tanto os sócios atuais quanto os sócios retirantes, deve ser atribuída, inicialmente a responsabilidade dos sócios atuais e, apenas posteriormente, a responsabilidade dos sócios retirantes, ante o teor do disposto no artigo 10-A da CLT. LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS. Não se há falar em limitação da responsabilidade de acordo com a participação na sociedade, sendo oportuno destacar que os riscos da atividade econômica não podem ser transferidos ao hipossuficiente, razão porque o (a) sócio (a) responde subsidiariamente pelas dívidas da sociedade insolvente, independentemente da quantidade de quotas que detenha, conforme uníssona jurisprudência trabalhista. (TRT-1 – AP: 00113612320155010038 RJ, Relator: MONICA BATISTA VIEIRA PUGLIA, Data de Julgamento: 14/04/2021, Terceira Turma, Data de Publicação: 29/04/2021) (grifo nosso)

Na seara trabalhista, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica pode ser instaurado pela parte interessada ou pelo Ministério Público e suspende o processo até a conclusão do seu julgamento, tendo por objetivo assegurar a efetividade das execuções dos créditos dos trabalhadores e permite que, caso não seja possível executar a pessoa jurídica, que seja alcançado o patrimônio dos sócios.

Ou seja, trata-se da chamada “responsabilidade subsidiária”, isto é, os bens dos sócios somente poderiam ser atingidos após esgotados os meios de execução e não localizados bens da sociedade empresária. Este, portanto, seria um dos limites à execução dos bens particulares dos sócios.

Também, a desconsideração da personalidade jurídica pode se basear em uma das duas teorias estabelecidas pela doutrina, são elas (i) teoria menor: exige apenas o inadimplemento da obrigação perante o credor para que se opere a desconsideração da personalidade jurídica, e (ii) teoria maior: prevista no art. 50 do CC e 28 do CDC, exige a comprovação de fraude, abuso, ou confusão patrimonial entre os bens da pessoa física com os da pessoa jurídica.

É, portanto, com base na chamada “teoria menor” que a jurisprudência trabalhista tem alargado as hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica, inclusive nos casos de sociedade por quotas de responsabilidade limitada.

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INSTAURAÇÃO DO INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. No Processo do Trabalho, o entendimento é no sentido de que a desconsideração da personalidade jurídica tem amparo no disposto no art. 28, § 5º, do CDC, com base no princípio da proteção, que informa o Direito do Trabalho. Desta maneira, basta a inadimplência da empresa para que os sócios sejam atingidos pela execução. Porém, faz-se necessária a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do art. 6º da IN nº 39/2016 do TST e dos arts. 133 a 137 do CPC/15. Agravo parcialmente provido. (TRT-1 – AP: 00102158320145010004 RJ, Relator: ROBERTO NORRIS, Data de Julgamento: 04/05/2021, Quarta Turma, Data de Publicação: 06/05/2021). (grifo nosso)

Após esses esclarecimentos, a próxima dúvida que pode surgir seria: até quando um sócio que já se retirou da sociedade responde pessoalmente com seus bens pelas dívidas trabalhistas?

O limite legal para responsabilização pessoal de sócio retirante é de até 2 (dois) anos após averbada a modificação do contrato social com sua saída, nos termos do art. 10-A da CLT[2]. Na jurisprudência dos tribunais encontramos a aplicação prática deste dispositivo normativo. Vejamos:

SÓCIO RETIRANTE. ART. 10-A DA CLT. Nos termos do art. 10-A da CLT, o sócio retirante responde pelas obrigações trabalhistas da sociedade, relativas ao período em que figurou como sócio, até dois anos depois de averbada a modificação do contrato. (TRT-1 – RO: 01003216520195010247 RJ, Relator: MARIA HELENA MOTTA, Data de Julgamento: 17/03/2021, Sexta Turma, Data de Publicação: 23/03/2021) (grifo nosso)

Finalmente, e no que diz respeito às sociedades anônimas, como ocorre a desconsideração da personalidade jurídica? E as associações sem fins lucrativos? Também estão sujeitas à desconsideração da personalidade jurídica?

No que diz respeito às Sociedade Anônimas, a responsabilização de seus integrantes não ocorre sem que haja evidência comprobatória de gestão fraudulenta ou ilícita, como no caso a seguir em que os sócios foram responsabilizados por descumprimento de obrigações trabalhistas:

SOCIEDADE ANÔNIMA FECHADA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. POSSIBILIDADE. A desconsideração da personalidade jurídica de sociedade anônima fechada é possível, dada a sua semelhança com a sociedade por quotas de responsabilidade limitada, mormente quando os sócios indicados pelo exequente permaneceram na Diretoria da reclamada ao longo de todo o período do vínculo empregatício do autor. (TRT-1 – AP: 01003298120175010483 RJ, Relator: TANIA DA SILVA GARCIA, Data de Julgamento: 03/05/2021, Quarta Turma, Data de Publicação: 11/05/2021) (grifo nosso)

Já quanto as associações sem fins lucrativos, estas também estão sujeitas à desconsideração da personalidade jurídica. A jurisprudência, entretanto, aponta para seu cabimento excepcionalmente com base na teoria maior. Para tanto, é necessário a concretização do desvio de finalidade ou confusão patrimonial:

AGRAVO DE PETIÇÃO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS. INDEPENDENTEMENTE DA FORMA DE CONSTITUIÇÃO, EM SE TRATANDO DE RELAÇÃO DE EMPREGO, É POSSÍVEL A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. NO ENTANTO, NO CASO DE UMA INSTITUIÇÃO DE CARÁTER BENEFICENTE, SEM FINS LUCRATIVOS, A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA SÓ PODE SER COGITADA EM CARÁTER EXCEPCIONAL, QUANDO VERIFICADA, DE FORMA ROBUSTA, A OCORRÊNCIA DOS REQUISITOS ESTABELECIDOS NO ART. 50 DO CÓDIGO CIVIL. (TRT-1 – AP: 00106531920135010013 RJ, RELATOR: ALBA VALERIA GUEDES FERNANDES DA SILVA, DATA DE JULGAMENTO: 17/03/2021, DÉCIMA TURMA, DATA DE PUBLICAÇÃO: 10/04/2021) (grifo nosso)

Assim, podemos perceber que as especificidades do caso concreto podem resultar em diferentes panoramas. O acompanhamento por profissional habilitado garante que todas as medidas jurídicas sejam tomadas de modo a obter prestação jurisdicional satisfatória.

O GFAA tem auxiliado seus clientes nessas questões e se coloca à disposição para esclarecer eventuais dúvidas.

 

Artigo elaborado por Lorraine Rodrigues e revisado por Alessandra Fagundes.

 

[1] O termo “empresa” aqui é usado para designar a atividade econômica organizada para produção de bens e serviços, nos termos do art. 966 do Código Civil.

[2] Art. 10-A.  O sócio retirante responde subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, observada a seguinte ordem de preferência:

I – a empresa devedora

II – os sócios atuais;

III – os sócios retirantes.

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